Fishman, que trabalhou como conselheiro na administração Obama, projetou uma nova ordem mundial com um sistema de dois níveis: um nível global em que participam as grandes potências e um nível paralelo que reunirá democracias com afinidades
O ex-responsável de planeamento do Departamento de Estado norte-americano Edward Fishman avisou em meados de Junho que as alterações forçadas pela pandemia de Covid-19 irão levar ao estabelecimento de uma nova ordem mundial nos próximos um a cinco anos.
“Estou convencido de que este será um momento de transição”, afirmou o especialista, que é investigador não residente do Conselho do Atlântico e investigador adjunto do Centro para uma Nova Segurança Americana, falando numa sessão organizada pela Associação de Correspondentes Estrangeiros nos Estados Unidos.
“Há um desejo inerente de voltar à normalidade e uma nostalgia para regressar à vida pré-pandemia”, afirmou. “É importante aceitarmos que não haverá um regresso ao normal e que uma crise desta magnitude não desaparece simplesmente de um dia para o outro”.
Fishman, que trabalhou como conselheiro para o Secretário de Estado da administração Obama, John Kerry, projetou uma nova ordem mundial com um sistema de dois níveis. Um nível global em que participam todas as grandes potências e um nível paralelo que reunirá o que descreve como democracias com afinidades, cujos princípios são semelhantes.
“O nível global tem de ter um âmbito estrito, focar-se apenas nos problemas de ação coletiva: alterações climáticas, ciber segurança e pandemias”, declarou o especialista. “O nível das democracias com afinidades deve focar-se em problemas mais divisivos e ambiciosos: desinformação, evasão fiscal e desigualdade”.
O ex-conselheiro afirmou que este momento deverá levar a uma “retirada ordeira e pensada da globalização”, frisando as “consequências muito negativas” que teve na sociedade, que o período pós-pandemia justifica a criação de cadeias de fornecimento alternativas (por exemplo para produtos farmacêuticos) e que as infraestruturas devem ser construídas entre democracias com afinidades.
A aliança D10 proposta pelo Reino Unido para contornar a importância da China e da Huawei no fornecimento de equipamento 5G é, segundo ele, um exemplo disso.
O estabelecimento do nível de democracias com afinidades não será, considerou, feito através de um único grande acordo ou conferência. “Estou céptico de que a nova ordem nasça num grande Summit”, disse, referindo que haverá vários eventos importantes.
“À medida que os líderes puderem encontrar-se em pessoa começaremos a ver essas coisas a acontecer”, considerou, referindo a proposta do candidato democrata à Casa Branca, Joe Biden, para a realização de um “Summit para a Democracia”.
“É erróneo pensar que as consequências das eleições de 2020 não são imensas para o estabelecimento da nova ordem mundial”, acrescentou.