A Loftleidir Cabo Verde, de investidores islandeses, anunciou hoje que pretende reverter a renacionalização da companhia Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV), feita este mês pelo Governo, e ser “ressarcida pelos prejuízos causados” por aquela decisão
Loftleidir Cabo Verde encontra-se a analisar quais os seus direitos e que meios legais tem à sua disposição para inverter esta nacionalização e ser ressarcida pelos prejuízos causados por esta ação do Estado cabo-verdiano”, anunciou hoje a empresa, em comunicado da sua assessoria enviado à Lusa.
O Estado cabo-verdiano assumiu em 06 de julho a posição de 51% TACV detida desde 2019 por investidores islandeses liderados pela Loftleidir Cabo Verde (grupo Icelandair), alegando vários incumprimentos na gestão e dissolvendo de imediato os corpos sociais.
No comunicado de hoje, a Loftleidir Cabo Verde afirma que “contesta” a decisão do Governo de nacionalizar as suas ações na TACV e garante que “o grupo de investidores está, atualmente, a analisar a questão e a preparar a respetiva reação”.
“A Loftleidir Cabo Verde reitera que cumpriu todas as suas obrigações desde o momento da aquisição das ações em 2019 e, com a nova administração, obteve um crescimento significativo da companhia aérea de mais de 130%, com a criação de um ‘hub’ internacional no Sal, ligando a Europa e América do Sul e posteriormente África Ocidental e América do Norte”, lê-se no comunicado, acrescentando que o desempenho financeiro da companhia “melhorou consideravelmente”, chegando a receitas de 6.755 milhões de escudos (mais de 61 milhões de euros) em 2019.
Em março de 2019, o Estado de Cabo Verde vendeu 51% da então empresa pública TACV por 1,3 milhões de euros à Lofleidir Cabo Verde, empresa detida em 70% pela Loftleidir Icelandic EHF (grupo Icelandair, que ficou com 36% da CVA) e em 30% por empresários islandeses com experiência no setor da aviação (que assumiram os restantes 15% da quota de 51% privatizada).
A reversão de privatização da Cabo Verde Airlines (CVA – nome comercial adotado desde 2019 para a TACV) teve efeitos a partir daquele dia, com a publicação do decreto-lei que a autoriza, aprovada pelo Conselho de Ministros, face às “sérias preocupações” com o “cumprimento dos princípios, termos, pressupostos e fins” definidos no processo de privatização.
Em 13 de julho, a companhia – que não realiza voos comerciais devido à pandemia de covid-19, desde março de 2020 – anunciou o cancelamento de “todos os voos” do plano de retoma da atividade, que previa progressivamente voos do arquipélago para Lisboa, Paris e Boston.
No comunicado de hoje, a Lofleidir Cabo Verde recorda que em março de 2021, após um “longo período de constrangimentos” causados pela pandemia, em conjunto com o Estado cabo-verdiano (39% do capital social da TACV), foi assinado um “acordo de resolução para a reorganização financeira da companhia, com vista ao relançamento das suas operações”, prevendo a nomeação de um representante do Estado, com a função de vice-presidente responsável pela tesouraria, para “acompanhar a aplicação de fundos e o pagamento de dívidas”.
“Como parte deste acordo, a Loftleidir Cabo Verde conseguiu um desconto significativo no saldo em dívida da companhia aérea, perante a concessão de uma garantia de empréstimo pelo Estado cabo-verdiano”, acrescenta-se no comunicado, que também acusa o Estado de não ter cumprido o entendimento.
A situação, afirmam ainda, deu origem a uma ação judicial por parte da empresa estatal ASA, que gere os aeroportos de Cabo Verde, e levou “à apreensão de uma das aeronaves da companhia aérea” – fornecida em regime de ‘leasing’ pela Loftleidir Icelandic EHF -, que “não é propriedade” da TACV, pelo que alegam que “não tem base legal e já foi contestada em tribunal”.
“Esta ação ilegal do Estado cabo-verdiano prejudicou a companhia aérea e resultou numa maior deterioração da sua situação financeira”, considera a Loftleidir Cabo Verde.
A empresa garante ter agido “sempre em total conformidade” com o acordo de resolução e os restantes documentos contratuais, assumindo que “foi com absoluta surpresa” que estes investidores “tomaram conhecimento da decisão do Governo, que obviamente repudiam”.
Na base da decisão de reverter a privatização, o Governo alegou preocupações como o “cumprimento com os procedimentos acordados de pagamento de despesas, registo contabilístico e contratação”, a “salvaguarda dos interesses da empresa e objetivos da parceria em consequência de envolvimento em atos e contratos que revelam substâncias e sérios conflitos de interesse”, a “contribuição para o reforço da capacidade económico-financeira e da estrutura de capital” da companhia ou sobre a “concretização integral da venda direta em prazo, condições de pagamento e demais termos”.
De novembro a março último, o Governo cabo-verdiano autorizou a emissão de avales do Estado a cerca de 20 milhões de euros de empréstimos para pagamentos de salários e outras despesas urgentes da TACV/CVA.
“Posteriormente ao acordo de resolução, foram identificados factos na governança dos TACV e no relacionamento da Loftleidir Cabo Verde e partes interessadas com os TACV que podem contribuir para a insustentabilidade da continuidade do acordo, pois que existe um risco sério, real e significativo de a Loftleidir Cabo Verde não cumprir com a sua proposta de investimento de capital nos TACV”, acrescenta-se no decreto-lei.