Resumo
Este Artigo tem por objetivo apresentar uma análise sobre a importância do património cultural imaterial na atividade turística através da interpretação patrimonial no meio rural, de acordo com as tradições preservadas no cotidiano das populações das aldeias de Cabo Verde, visando ao desenvolvimento da atividade turística e impulsionando a preservação do património imaterial, de forma sustentável. Desta forma, se pretende captar um novo perfil turístico que possa favorecer outras ilhas do arquipélago que não oferecem o habitual, nomeadamente o turismo de sol e praia predominante em Cabo Verde.
Introdução
Este artigo tem como enfoque principal analisar a importância da Interpretação do Patrimônio imaterial como forma de agregar valor à atividade turística realizada nas comunidades rurais de Cabo Verde, apresentando os aspetos que determinam a interpretação do patrimônio imaterial como fator para a difusão e dinamização do turismo nas comunidades rurais de uma forma mais participativa por parte dos habitantes locais, promovendo uma interação saudável com os turistas que por sua vez, se converte numa grande oportunidade para captar um novo perfil de turista e consequentemente, o despontar para o turismo criativo, reforçando, assim, a capacidade de atrair outros públicos.
Baseando no fato de que a atividade turística desempenha um papel importante na preservação e resgate desse legado cultural, além de aproximar a comunidade local e turistas de forma mais harmoniosa e duradoura, deve-se salientar que o turismo rural se trata de uma nova forma para atrair outros perfis turísticos para Cabo Verde, criando novas oportunidades para o desenvolvimento destas comunidades.
Segundo (Putnam, 2003; Sumpsi, 2007) “o surgimento de experiências de desenvolvimento rural com base na valorização e interpretação do patrimônio cultural imaterial está a tornar-se cada vez mais frequente e visualizado no âmbito internacional, especialmente na Europa”. Sendo o turismo um dos maiores setores económicos de Cabo Verde, nos cabe traçar estratégias para a diversificação da sua oferta, evitando limitações de perfis turísticos, descentralizando-o do conceito do turismo de sol e praia predominante nas ilhas de Boa Vista e Sal, permitindo assim uma maior abrangência do território insular nas atividades turísticas, aproveitando o conhecimento popular e os costumes que determinam a nossa identidade e a diversidade cultural e que dá suporte ao nosso património cultural.
O Património Cultural Imaterial (PCI) é um conceito relativamente novo no quotidiano do Cabo-verdiano, segundo o IPC (Instituto do Património Cultural). A Convenção da UNESCO para Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, aquele que reúne um conjunto de práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas, junto com instrumentos, objetos, artefactos e lugares culturais que lhes são associados, que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante do seu património cultural.
Património Imaterial e o Turismo Rural.
Uma Perspetiva Sustentável Por Patrimônio Cultural Imaterial entende-se os usos, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – com os instrumentos, objetos, artefatos e espaços culturais que lhes são inerentes – que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos, reconheçam como parte integrante de seu Patrimônio Cultural. Transmitido de geração em geração, o PCI é recriado constantemente pelas comunidades e grupos em função de seu entorno, sua interação com a natureza e sua história, infundindo um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana (UNESCO, 2003).
Ao valorizar as singularidades históricas e culturais, de tradição e pertencimento, os atores locais podem produzir elementos mobilizadores e impulsionadores de geração de trabalho e renda e, ao mesmo tempo, o patrimônio passa a ser “reconhecido como elemento estruturante da memória, imagem e identidade territorial e como um dos recursos essenciais para a afirmação dos valores culturais e ambientais no quadro renovado das teorias de desenvolvimento” (Carvalho, 2003, p. 173).
O Turismo vem destacando-se como um fenômeno social muito importante no desenvolvimento de Cabo Verde e come é evidente, reflete diretamente no setor econômico e cultural, e, por meio de suas manifestações e fluxos, apresenta-se, por um lado, como uma atividade importante que integra povos, costumes e crenças, por outro lado, como uma área importante a ser incrementada para o desenvolvimento sustentável dos destinos turísticos.
Segundo Reis (2003, p. 47), o turismo cultural deve ser considerado: “uma atividade em que o deslocamento ocorre para lugares em que a motivação é à busca do conhecimento, da interação, da informação, da curiosidade cultural, dos costumes, da tradição e da identidade. Seus fundamentos são os elos entre passado e presente, (…) e representa a possibilidade da revitalização do patrimônio, de revigoramento das tradições, da redescoberta de comportamentos que foram suplantados pelo mundo moderno e da resinificação da cultura”.
Por conseguinte, o turismo rural surge como um importante instrumento na fomentação do desenvolvimento local sustentável, através da busca de alternativas para melhorar a qualidade de vida das populações rurais. É igualmente necessária uma consciência de que o desenvolvimento das zonas rurais deve ser concebido num quadro orientado para a integração das dimensões económica, social e cultural e no reconhecimento da pertença das populações e das comunidades rurais dinâmicas.
Com isto, os habitantes participam e beneficiam de um turismo alternativo e sustentável, que para além de colaborar com o desenvolvimento económico a nível local, protege e respeita as manifestações culturais e particulares das comunidades rurais das ilhas, neste caso, as que oferecem as condições favoráveis a este tipo de turismo. Ao mesmo tempo, dá ao visitante a oportunidade de conhecer uma cultura e desfrutar de uma atividade recreativa e pedagógica, capaz de gerar experiências únicas, uma vez que é entendida como uma estratégia que atinge o nexo e a coesão comum com elementos culturais de particular especificidade das comunidades rurais.
Oliveira et al (1999) define o turismo rural como “o conjunto de atividades turísticas relacionadas à produção agropecuária que agregam valor ao produto do meio rural, resgatando e promovendo o patrimônio cultural das comunidades do campo.”
O turismo no meio rural consiste em atividades de lazer realizadas no meio rural e abrange várias modalidades definidas com base em seus elementos de oferta: turismo rural, ecoturismo, turismo de aventura, turismo cultural, turismo alternativo, turismo verde, agroturismo, turismo de montanha, etc. (SILVA et al., 1998 apud CAMPANHOLA; SILVA, 1999, p. 147).
Este pensamento é compartilhado por diversos autores da área de turismo. Sendo que, Rodrigues, citado por Portuguez (1999) assinala que a evolução conceitual e a riqueza de terminologia vária conforme a realidade de cada país, expressa as diferentes formas de aproveitar os recursos do espaço rural e os programas e atividades empreendidas nessa área.
Como o Turismo é um ramo da economia e traz, com suas atividades, lucro para as localidades, pois há movimentação de capital com os diversos setores do mercado, é tendencioso tornar a memória intangível em produto de venda turística, ligando-se aos evocadores da memória. Há ainda os elementos da publicidade e do marketing que um produto supervalorizado gera para um lugar turístico. (CARVALHO, 2013, p. 40). 3.
O Potencial do Património Imaterial no desenvolvimento do turismo comunitário nas zonas rurais de Cabo Verde.
Este modelo de turismo é sem dúvida uma grande oportunidade para o desenvolvimento e divulgação do potencial turístico em algumas ilhas de Cabo Verde como turismo alternativo. A prática do turismo comunitário em zonas rurais é predominante nas ilhas de Santiago, Santo Antão, São Nicolau e Fogo, que por suas características peculiares, as permite acolher este tipo de turismo. Se trata de um dos modelos de turismo alternativo que estas ilhas podem oferecer pelas suas características, que por sua vez permite aos visitantes a explorarem o ambiente rural e, ao mesmo tempo, interagir com as populações locais, participando em atividades locais tais como os festas de romeira ou festividades com alguma simbologia identitária.
E prova disso é o crescimento acentuado noutras ilhas, onde um turismo de outro cariz assume cada vez maior importância: Santiago (17%; +10.400 turistas), Santo Antão (37%, +10.000 turistas), Fogo (26%, +1.300 turistas), Maio (80%, +450 turistas) e Brava (62%, +350 turistas); São Vicente sem variação relevante (+3%, 1.250 turistas). E estes resultados sem que se tenha organizado o Produto Turístico nem empenhada aposta na sua Promoção (Chantre, 2020).
Para Solís (2015), “as tendências atuais do turismo consistem em gerar ou conceber produtos onde as experiências são mais experimentais para os turistas.” Desta forma, emerge um novo perfil de turistas mais exigentes, com o desejo de adquirir maior consciência e conhecimento sobre a preservação e conservação da natureza e das culturas indígenas. Para o efeito, procuram otimizar a sua deslocação geográfica, visitando locais onde possam satisfazer as suas expectativas.
Partindo deste princípio, não é de se estranhar que as particularidades e manifestações culturais apresentadas pelas diferentes comunidades rurais do arquipélago sejam aproveitadas como trunfos de grande valor na prática do turismo. Assim sendo, é de se esperar que haja influência na valorização que os turistas e empresários do sector turístico atribuem a esta nova forma de praticar o turismo.
Esta iniciativa é reforçada pelos resultados obtidos a partir da investigação feita durante a elaboração da minha dissertação de Mestrado na área de Uso e Gestão do Património Cultural que permitiu-me observar que há uma crescente procura de produtos que contêm em si mesmos, tradição, costumes, representações coletivas e o contínuo saber-fazer dos residentes nas zonas rurais. Desta forma, o património cultural intangível pode surpreender como um produto que favorece o turismo, uma vez que inclui valores e expressões culturais.
Em Cabo Verde, foram observadas mudanças nas comunidades rurais no que diz respeito à aceitação do turismo pelos seus habitantes, o que faz um balanço positivo das experiências vividas entre visitantes e habitantes locais. As atitudes da população indígena estão relacionadas com a sua perceção das vantagens e desvantagens (da Cruz, 2015)1 .
Os autores (Mutinda & Cantoni, 2016) afirmam que “a fraca participação da comunidade causa perdas económicas e os restantes benefícios atingem principalmente a elite da sociedade.” Na mesma linha de pensamento, os autores (Nunko & Ramkissoon, 2011) & (Ward & Breno, 2011) salientam que “a população local, neste tipo de turismo, tem um 1 – Inventário dos Recursos Turísticos do Município do Paúl, Ilha de Santo Antão Consultar documento no website: http://www.portaldoconhecimento.gov.cv/ papel muito importante, não só no planeamento mas também na perceção dos benefícios.”
Considerações Finais
A atividade Turística em Cabo Verde é um fator Sine-qua-non para o desenvolvimento do país. Portanto, é muito importante que haja estratégias para a dinamização do setor, nomeadamente na diversificação da oferta e dos produtos turísticos que nos permite atrair novos perfis para a prática de outras vertentes do turismo, para além do turismo de sol e praia, que é a predominante no arquipélago.
Neste caso, a diversificação é apresentada como uma grande oportunidade para o desenvolvimento das comunidades das zonas rurais do arquipélago de uma forma sustentável, envolvendo a participação dos habitantes locais nas atividades recreativas que promovem a divulgação e a preservação do património e da identidade coletiva dos grupos sociais pertencentes as comunidades rurais de uma forma geral. Trata-se ainda de uma grande oportunidade de contribuir para a gestão do património cultural, através de atividades complementares que ajudam a dinamizar a vida e a economia dos territórios rurais.
Neste sentido que deve-se trabalhar nas políticas de desenvolvimento destinadas a melhorar todos os aspetos da vida nos territórios rurais através da reconceptualização das zonas rurais com o objetivo de promover uma relação estreita entre os interesses dos habitantes na melhoria da produção tradicional e a preservação dos recursos do meio rural.
Para (Arias e Vives, 2005), Dentro destas expressões transmitidas de uma geração para outra, “encontramos uma série de cosmovisões, línguas, formas de relacionamento, valores estruturados, tradições, costumes e conhecimentos particulares que resultam num determinado produto cultural intangível, que, se utilizado de forma responsável, aumentaria a oferta turística, a competitividade e um maior valor no mercado.”